Ex-ministro do
STF (Supremo Tribunal Federal) e do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), Carlos
Ayres Britto diz que o decreto de Jair Bolsonaro (PL) para conceder perdão de
pena ao deputado Daniel Silveira (PTB-RJ) “padece de inconstitucionalidade
autoevidente”. Ele afirma que “indulto não é cheque em branco”.
O jurista
também diz que o perdão não tem alcance para devolver os direitos políticos do
parlamentar, que também teve o mandato cassado e os direitos políticos
suspensos pelo STF.
Silveira foi
condenado a 8 anos e 9 meses de prisão pelos crimes de coação no curso do
processo (uso de violência ou de ameaça para obter vantagem em processo
judicial) e de incitação à tentativa de impedir o livre exercício dos Poderes.
Britto explica
que quando a Constituição destaca determinados crimes como de acentuada
gravidade e dedica cláusulas específicas a eles, colocando-os como
inafiançáveis, inanistiáveis ou imprescritíveis, ela está elaborando uma
política pública de Estado, que é, então, permanente. Os indultos, na visão de
Britto, são políticas públicas de governo, ou seja, são “episódicos,
transitórios”.
“O indulto não
é para perdoar crimes que a Constituição qualificou como especialmente danosos
para a coletividade”, diz ele. “Indulto não é cheque em branco. É preciso
compatibilizá-lo, enquanto política pública de governo, com a Constituição,
enquanto política pública de Estado”, completa.
Ele cita como
exemplos os crimes de terrorismo, tortura e atentado contra a ordem
constitucional e o Estado democrático de Direito entre a lista dos destacados
pela Constituição. Silveira foi condenado pelo último.
Ayres Britto
diz que sua reflexão sobre o tema vem sendo amadurecida pelo menos desde 2019,
quando o então presidente Michel Temer (MDB) publicou um decreto sobre indultos.
O ex-ministro lança mão de uma metáfora para ilustrar o raciocínio.
“Assim como o
rei Midas transformava em ouro tudo o que tocava, a Constituição torna
especialmente relevante tudo a que se refere. É a lei fundamental. As leis são
feitas pelo Estado. A Constituição é feita pela nação, que é superior, exterior
ao Estado. Quando a Constituição consagra uma política pública, pela especial
relevância, pela gravidade do crime, logicamente pré-excluiu o manejo do
indulto”, explica.
Sobre a
possibilidade de que o decreto de Bolsonaro dê a Silveira o direito de disputar
as eleições em outubro, leitura que tem sido disseminada por apoiadores do
presidente, Ayres Britto é categórico na negativa.
“Indulto não é
para elegibilizar quem se tornou inelegível. Inelegibilidade não pode ser
afastada por indulto. É matéria político-eleitoral, não é matéria penal”,
conclui.
Fábio Zanini/Folhapress
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